sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Enter the Void

Enter the Void, 2010 / Dirigido por Gaspar Noé

Com Paz de la Huerta, Nathaniel Brown, Cyril Roy, Olly Alexander e Masato Tano


(2/5)

A primeira coisa que deve ser dita sobre Enter the Void é que este não é um filme normal. Não. Enter the Void é uma experiência única, para o bem ou para o mal, para qualquer espectador que atreva-se a se aventurar pelas longas duas horas e q uarenta e um minutos de filme. Gaspar Noé, diretor do ledário, bobo, polêmico e violento Irreversível (Irréversible, 2002), prova que o passar dos segundos, o tempo, é totalmente relativo.

Este é um filme ao melhor estilo “ame ou odeie-me”. Para compreender, ou mesmo gostar deste filme, precisamos comprar a ideia de Noé, embarcar em sua viagem lisérgica, e, primo, isso é muito difícil. Noé passou mais de dez anos compondo sua história ácida (no sentido de ácido lisérgico) e transcendental sobre um garoto que morre, mas seu espírito permanece para cuidar da irmã. O problema é que nem mesmo ele sabe como guiar o filme. O diretor aposta tudo nas imagens supercoloridas, verdadeiras aberrações cromáticas. Enter the Void é um soco na retina e no cérebro. Mas é um soco gratuito. Desnecessário.

O filme—conforme o próprio diretor afirma—é uma reunião de várias experiências que teve quando jovem. Sejam elas visuais ou obtidas através de alucinógenos. Sim, Enter the Void é basicamente uma reunião das maiores viagens que Gaspar Noé teve quando era garoto. Não é de se admirar que o filme tem apenas um fiapo de trama: Oscar (o iniciante Nathaniel Brown) muda-se para Tóquio, e vira um traficante de drogas. Após conseguir ganhar algum dinheiro, consegue trazer sua irmã, Linda (Paz de la Huerta), para perto dele. Certa noite, Oscar tem que fazer uma entrega para Victor (Olly Alexander). Há algo de muito errado com a expressão de Victor, que tem a estranha mania de introduzir o dedo no ânus e limpar no cabelo dos outros (o porquê dessa pausa no texto será explicado mais tarde). De repente, a polícia chega no bar onde os dois estão fazendo a transação, chamado “The Void”. Oscar se esconde no banheiro, tenta se livrar das drogas, mas é atingido por um tiro, e morre. O corpo sim, mas não o espírito. Agora ele ficará vagando para proteger sua irmã.

Repetindo, Enter the Void é um soco visual. O filme parece querer viver apenas disso. Tudo aqui foi feito—ao que parece—com a intenção de provocar um ataque de labirintite no espectador. É claro, Noé estava tentando fazer a pessoa que está assistindo embarcar na mesma experiência de Oscar. Isso é uma atitude louvável. Mas para um filme de 161 minutos, torna-se letalmente cansativo.

O impacto que o filme causa é sentido logo nos primeiros segundos de projeção. Os créditos iniciais são apresentados integralmente, logo no início do filme, da forma mais sucinta possível. A música eletrônica marca uma onipresença jamais vista num filme. Aliás, muitas coisas vistas em Enter the Void jamais serão vistas novamente. Por exemplo, testemunhamos uma relação sexual de dentro da vagina de uma das personagens.

O impacto visual se estende na fotografia away do filme. O trabalho visual do diretor de fotografia de Benoît Debie. Ele e Noé apostam tudo numa estética altamente lisergida, tudo brilha, tudo parece ser feito de tubos de neon, e talvez até seja mesmo. Conforme dito em entrevistas, os dois utilizaram muita pouca luz artificial, filmando com o auxilio dos enormes painéis coloridos de Tóquio. Funcionou? Sem dúvidas. Ainda mais impressionante do que essa fotografia escandalosa de Debie, são os enquadramentos do filme. Enter the Void é contado, totalmente, a partir do ponto de vista de Oscar. Antes da sua morte, caminhamos vento tudo do seu globo ocular. Depois da sua morte, vagamos pelos cenários. Nos primeiros minutos isso funciona muito bem. Quando Oscar consome DTM, a viagem que temos (nós acompanhamos da sua mente) é simplesmente espetacular. Não é atoa que muitos críticos compararam esta obra com 2001: Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick. Mais precisamente, com a sequência do wormhole. Realmente parece. Só que Noé não é Kubrick. E isso é um erro grave.

O diretor se afoga num mar de pretensão, e junto com ele, o filme vai junto. Este é um filme perdido dentro de si mesmo. A estética visual adotada por Gaspar Noé se torna vazia, burocrática e aborrecida a medida que o tempo passa. Provavelmente, para um público despreparado (talvez todos nós), estes serão os 161 minutos mais longos das suas vidas. De fato, com uma hora de filme, a impressão que temos é que Noé já passou da conta. O visual regado a LSD, a edição esquisita e os planos irregulares, de cima para baixo, se tornam chatos. Enter the Void se torna, lentamente, uma espécie de lavagem cerebral malfeita. Até os atores parecem saber disso.

O filme nos apresenta uma gama de personagens esquisitos. Lembram-se quando eu mencionei a estranha mania que Victor tem? De colocar o dedo no ânus e... bem, isso é só o começo. Um dos contatos de Oscar faz uma maquete que representa “Tóquio sob LSD”. Ao apagar das luzes, a maquete se ascende. (Foi nesse momento em que comecei a pensar se tudo nesse filme é feito de néon.) Para representar toda essa galera bonita, os atores, salvo Paz de la Huerta, adotam uma postura entorpecida. Nathaniel Brown que o diga. O garoto não aparece quinze minutos em cena e morre. OK, ele reaparece depois, no seu sonho pós-morte. O problema de Brown é que sua atuação é totalmente inexpressiva. Em termos claros e não acadêmicos: Nathaniel Brown age como se tivesse fumado maconha durante 24 horas por dia.

Paz de la Huerta, ao contrário, interpreta uma Linda quase perfeita. Sua expressão passa intensidade e, ao mesmo tempo, sofrimento. A cena em que ela joga as cinzas do seu irmão pelo ralo e diz “Esta coisa não é meu irmão” é um ótimo exemplo do quão boa ela está. Ainda mais, La Huerta se entrega de corpo e alma ao papel. Não são poucas as vezes em que ela mostra coragem se despir e, ainda mais, interpretar cenas de sexo não simulado (a penetração é nítida). Vale lembrar que La Huerta fica constantemente despida na série Boardwalk Empire, produzida por Martin Scorsese.

Gaspar Noé desafiou nossa sanidade mental e nossos olhos em Enter the Void. Um filme dificílimo. Mas afogado em pretensão. Enter the Void é um erro. Bonito, mas ainda um erro.

Por Victor Bruno

4 comentários:

só um adendo: acho que o sexo mostrado é simulação. quando assiti irreversível, vi o making off e o penis do rapaz que estuprava a monica belucci era fake, colocado na pós. acho que é o mesmo caso desse filme (que aliás, tem muuuuuita pós)

Partilho da opinião. Achei o filme horrível e acho que fazer ou escrever filmes sobre o efeito de drogas psicadélicas tinha que dar nisto...

Um erro é esse blog. Tá tudo errado aqui! Vai estudar

"Gaspar Noé desafiou nossa sanidade mental e nossos olhos em Enter the Void. Um filme dificílimo."

Essa parte resume. O filme é tão dificil e desfiador que você não conseguiu enxergar nada. :) Bela crítica, mas dizer que Enter the Void é um erro, é um erro maior ainda.

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