The Million Dollar Hotel, 2000 / Dirigido por Wim Wenders
Com Jeremy Davies, Mila Jovovich, Mel Gibson, Jimmy Smits, Peter Stormare, Gloria Stuart, Amanda Plummer e Tim Roth
(2/5)
Enquanto voamos em direção a rua, na primeira cena de O Hotel de Um Milhão, escutamos uma tranqüila voz dizer que a vida é perfeita. Uma voz que diz tudo sem pressa, letra por letra. É a voz de Tom Tom (Jeremy Davies).
Estamos no seu ponto de vista, descendo, a cada segundo que se passa, um andar do Million Dollar Hotel, que dá nome ao título do filme. Alguns segundos antes estávamos vendo Tom Tom na cobertura do prédio, saltando para a morte, que se encontra na rua, lá embaixo.
Não são necessários cinco frames de filme para identificarmos que estamos assistindo a um filme do lendário Wim Wenders. A estética polida predomina em todas as cenas. Os enquadramentos certeiros, a mistura de cores, tudo tem o padrão Wenders de qualidade. O que se torna um problema, conforme veremos a frente.
Talvez o que chame mais atenção neste filme não seja o nome do seu diretor, mas sim o nome do seu roteirista: Bono. Sim, Bono Vox, do U2. O argumento qual o filme se baseia foi escrito por ele, junto com Nicholas Klein, roteirista do filme. E, sendo franco, era um filme que tinha muito potencial.
Mas, infelizmente, Wenders jogou isso no lixo. Logo nas primeiras cenas, fica clara a desorganização da montagem do filme. As idéias ficam soltas, sem nem um tipo de nexo claro. Não conseguimos nem mesmo ver algum tipo de vontade de Wenders em deixar a história ao menos palatável para o espectador. Não sei se foi pretensão de Wenders, mas o fato é que O Hotel de Um Milhão de Dólares é um caos completo. O trabalho da montadora Tatiana S. Riegel é um lixo, sem dúvidas. Não vejo um trabalho de montagem tão malfeito desde que assisti a Um Domingo Qualquer (Any Given Sunday, 1999).
Mas claro, o filme não é problemático só por causa da falta de eficiência da montagem. A história do filme é difícil de ser orquestrada. Apesar da estória desenvolvida por Bono e Klein, o resultado sai um desastre. E aqui nem posso recriminar o vocalista do U2. A premissa elaborada por ele – como disse ali atrás – é bem interessante, tinha muito potencial. Tinha. Mas o resultado é desastroso. Em nenhum momento o roteirista Nicholas Klein consegue colocar emoção em qualquer situação. Os diálogos são fracos, as construções dos personagens são, sem dúvidas, preguiçosas. As histórias dos personagens do Million Dollar Hotel são absolutamente chatas. Klein tentou montar uma gama de personagens tão bizarros (mas bizarros mesmo, como se estivéssemos num filme de Terry Gilliam), tão folclóricos, que terminamos considerando-os simplesmente... aberrações. A única personagem que eu considerei realmente interessante foi a Eloise de Mila Jovovich. E talvez seja a única personagem que tem uma construção realmente decente, e possivelmente seja por que Eloise é o estopim de toda trama do filme. Mas nem isso Klein consegue sustentar. Observe como a personalidade de Eloise muda repentinamente durante a trama: Se no início ela era uma garota apática, um nada humano (em um momento chave do filme, a personagem de Tim Roth faz um comentário que resume a personalidade da Eloise no início da trama); no final Eloise se torna ativa, enérgica. Ela deixa de ser mais uma louca que o Governo mandou para aquela pocilga de hotel e se torna uma personagem que parece ter plena consciência dos seus atos. O idiota da vila interpretado por Adrien Brody em A Vila (The Village, 2004) dá de pau em cima de Eloise.
Só que é admirável a capacidade do filme de conseguir colocar todos aqueles tipos escabrosos num hotel. O problema de O Hotel de Um Milhão de Dólares é sua pretensão. Wenders errou feio quando pegou o roteiro de Klein. Mas vamos dar algum crédito para o homem: Ele tem um claro carinho pelas suas personagens. Observe que cada um tem sua marca pessoal (exceto Gloria Stuart, que está apagadíssima na trama). Dixie (Peter Stormare) é o mais interessante deles. O habitante do hotel que acredita piamente ter sido letrista dos Beatles é simplesmente impagável. Ele é tão interessante, mas tão interessante, que é claro o cuidado maior que a produção teve com ele. Observe a presença das capas dos álbuns “Abbey Road” e “Magical Mistery Tour” (um dos mais fracos álbuns do Fab Four, na minha opinião, apesar das faixas “Fool on the Hill” e “Baby You’re a Rich Man”), entre outras interessantes referências a banda. Por exemplo, ele gosta de ser chamado de The Walrus (da música “I Am the Walrus”), etc.
Entretanto, apesar disso, Wenders faz um trabalho enfadonho e aborrecido. É impressionante a demora que o cineasta tem de construir todo o esqueleto narrativo (se é que ele conseguiu construir um). De fato, em nenhum momento senti que Wenders queria conduzir a investigação cujo filme gira em torno (o suicídio de um dos moradores do Million Dollar Hotel). Wenders parece querer mais é mostrar o interesse amoroso de Tom Tom com Eloise – o que se prova um fato no momento em que percebemos que sentimos medo pelo futuro desse romance, especialmente na última cena. Deste modo, O Hotel de Um Milhão de Dólares prova-se outro retrato de Wim Wenders sobre as relações humanas, tema caro ao diretor (vide o ótimo Alice nas Cidades e a sua obra-prima Paris, Texas).
Talvez eu esteja pegando pesado demais com o filme. Mas é um fato que tudo aqui funciona mal. Os buracos na trama são pavorosos (em um momento a personagem de Mel Gibson inunda o hotel e num outro momento o hotel aparece totalmente seco), as atuações são deliberadamente teatrais e exageradas. Chega a ser deprimente quando vemos Jeremy Davies andar tal qual um macaco.
No mais, Gibson, lá em 2000 numa coletiva de imprensa, estava coberto de razão: Este filme é chato como uma bunda de cachorro. Com uma hora de projeção não vemos a hora de o filme acabar. É um vazio, um nada.
E de onde é que o Wenders tirou aquela música eletrônica?
Por Victor Bruno
12/06/2011
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