domingo, 31 de outubro de 2010

O Talentoso Ripley

O Talentoso Ripley

The Talented Mr. Ripley, 1999
Dirigido por Anthony Minghella
Roteiro de Anthony Minghela (baseado no livro de Patricia Highsmith)
Com Matt Damon, Jude Law, Gwyneth Paltrow, Philip Seymour Hoffman, Cate Blanchet, Jack Davenport

Em tempos de eleições é sempre bom rever filmes sobre mentirosos. Obras primas ou não, este tipo de filme sempre é muito interessante, até por que instiga a mente do espectador, fazendo-nos julgar a pessoa que está contando a lorota. Neste tipo de filme nós praticamente saltamos da cadeira e dizemos para o ingênuo moço que está acreditando na mentira "Ei! Não confie nele! Ele está mentindo!"

Mais interessante ainda é quando o filme não retrata o mentiroso como um crápula, sem-vergonha e amoral. Filmes que retratam mentirosos como verdadeiros demônios podem soar quase ofensivos, porque, como diz o filósofo "Todo mundo mente." Só que é muito difícil existir um filme assim, por que os mentirosos -- principalmente os compulsivos -- são crápulas, sem vergonhas e amorais. Melhor é o mentiroso que conta um engodo por ser vítima das circunstâncias. Normalmente são eles mesmos que criam estas circunstâncias, por suas próprias mentiras. Mentirosos como Frank Abagnale, Jr e este mesmo Tom Ripley são adoráveis e cativantes. Cada um ao seu modo.


O ótimo (e saudoso) cineasta inglês Anthony Minghella (de O Paciente Inglês e Cold Mountain) faz um minucioso retrato da mente te um mentiroso. Baseado no primeiro dos cinco livros da série "Riplied" (que ainda não li) da escritora Patricia Highsmith, o filme conta a história do tímido Tom Ripley, que trabalha como pianista em Nova York. Tom tem também uma incrível habilidade para mentir, copiar a caligrafia e a voz das pessoas.. Certo dia, após tocar para a a família Greenleaf, o rico Hebert pergunta se Tom estudou em Princeton. Tom, obviamente mentindo, diz que sim. Herbert rapidamente propõe que Tom deva viajar para a Itália para convencer seu filho Dickie à voltar para casa. Tom aceita. Ao chegar lá ele se torna obsessivo por Dickie, e essa obsessão acaba por ativar um lado psicótico de Tom e ele mata o rapaz. Isto o leva à contar um emaranhado de mentiras e ainda por cima algo mais horroroso: assumir a identidade de Dickie.

Matt Damon interpreta seu personagem de modo honesto e eficiente. Seu Ripley é um garoto inicialmente tímido, mas que não exita em mentir e enganar. Entretanto é tolo. A primeira coisa que escutamos no filme vinda da sua boca é "Se eu pudesse voltar ao passado e mudar algo, eu começaria pelo empréstimo de um paletó." Ele é tolo ao dizer que a culpa é do paletó. A culpa é de Ripley ao mentir dizendo que havia estudado em Princeton. Esta é a primeira mentira de uma série de outras que cuminam em uma desgraça arrasadora. O resto do elenco está igualmente bom. Jude Law explosivo, Gwyneth Paltrow apagada e confusa... a única falha é, estranhamente, de Philip Baker Hall (!), que faz uma interpretação de amargar.

O roteiro de Minghela é muito bom, assim como sua direção, é ótimo. Eu estranhei um pouco pelo fato de Minghella não ceder seus primeiros minutos para nos apresentar a personagem, suas características e seu "talento". Minghella vai direto ao ponto, empurrando Ripley direto para a Itália. É durante o próprio filme que o diretor-roteirista desenvolve e nos apresenta o talento de Ripley. Ele não mede esforços para mentir quem é.


Quanto a direção, Minghella apresenta interessantes ironias. Ao mostrar alguém sendo quem não é, com 18 minutos estamos dentro de um bar vendo Ripley cantar Tuo Vuo Fa 'Ammericano, em português "Você Finge Ser Americano". Fingir. Verbo que vai sendo cada vez mais utilizado e mostrado durante todo filme. Com sorte a direção de Minghella se mostra absolutamente acertada, principalmente no que diz respeito ao mostrar o homossexualismo com respeito, e não como algo sodômico. (Brokeback Mountain? Alguém?)

Entretanto O Talentoso Ripley tem, naturalmente falhas. Infelizmente é aonde mais admirei o filme: no seu roteiro. Minghella coloca alguns fatos como se fossem relevantes, ou às vezes tenta enganar o espectador. Um exemplo: a morte da personagem Silvana (uma mulher por quem Dickie tinha um affair) serve apenas para mostrar um pouco da obsessão de Ripley, coisa que poderia ter sido feita sem esta morte. Mas isso não atrapalha muito.

Como outros acertos podemos citar o excelente som e edição do mestre Walter Murch, que editou filmes do super-calibre de O Poderoso Chefão - Parte II e Apocalypse Now. A direção de arte (Roy Walker) e a fotografia do mestre John Seale estão igualmente lindas. A música de Gabriel Yared é muito boa também.

É interessante o fato da personagem ler Shakespeare, pois sua trama lembra muito as mais tristes tragédias do autor inglês. Lembra Otelo com o jogo de mentiras, Romeu e Julieta com um amor impossível, A Tempestade com suas personagens traidoras, e por aí afora. Minghella mostra brilhantemente que mentir não compensa.

Mas isso importa para alguém como o talentoso Ripley?

Nota: 4 estrelas em 5.

Por Victor Bruno

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