quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O Pequeno Nicolau

Le Petit Nicolas, 2009 / França-Bélgica / Dirigido por Laurent Tirard

Com Maxime Godart, Charles Vaillant, Vincent Claude, Benjamin Averty, Germain Petit Damico, Victor Carles, Damien Ferdel e Virgile Tirard

Medo. Essa é a primeira palavra que vem a cabeça de uma criança quando descobre que terá um irmão. Como uma criança pode lidar com a possibilidade de não ser mais a estrela-maior da casa? Essa é uma boa pergunta, não? Se você teve infância e é o primogênito da família, com certeza já deve ter cogitado a possibilidade de ter um irmão. Para o bem ou para o mal, é uma experiência única.

É a partir deste tópico que o diretor Laurent Tirard (de As Aventuras de Moliére) trabalha seu infantil (e brilhante) O Pequeno Nicolau. O filme, baseado nos quadrinhos de René Gosciny e Sampé, é um retrato sincero e feliz da infância. No caso a infância de Nicolau (Maxime Godart, em sua estréia no cinema). Ele é um garoto popular, esperto, e está sempre cercado de amigos. Certo dia o garoto Joachim (Virgile Tirard, filho do diretor Laurent Tirard) chega atrasado na sua escola. Ele está com uma expressão desolada. Seu irmão acabou de nascer. E, amigo, isto é um golpe duro para Joachim.


Joachim conta para os colegar que foi uma experiência repentina. Num momento ele estava em casa e no outro estava com seu pai no hospital, esperando a mãe dar a luz. Isso mexe profundamente com Nicolau, que passa a observar os habitos dos seus pais. Para a surpresa (e choque) dele, os novos hábitos dos seus progenitores batem perfeitamente com a descrição fornecida por Joachim. O pai de Nicolau passa a ser mais solidário e cortês com a mãe, coisa que não é do feitio dele, etc. Para aumentar ainda mais o pânico do pequeno Nicolau, surge a possibilidade do futuro bebê expulsá-lo de casa ter de ir morar na floresta, "como o Pequeno Polegar." A partir daí Nicolau e seus amigos vão bolar os mais mirabolantes planos para que nada de mau lhe aconteça. (Ou, se algo de ruim tenha de acontecer... bem, que seja com o bebê.)

O filme é bem sincero e divertido. Aliás, é um filme feito para toda a família assistir, e se encaixa perfeitamente no gênero "filme da Sessão da Tarde". Eu até escuto o Dirceu Rabelo falando "Esse garotinho vai aprontar confusões que até Deus duvida!" Mas isso não quer dizer que o filme seja ruim. Está muito longe disso. Laurent conta a história da melhor forma possível. A fotografia de Denis Rouden utiliza-se opta por usar cores primárias (bem como o ótimo design de produção) e abusa da movimentação da câmera, e isso é um grande acerto. De outro modo o filme assumiria um ar demasiadamente pesado, o que não é o objetivo deste filme.

Comparações com outro filme francês que também trata da infância são inevitáveis. Claro que eu só posso estar me referindo à Os Incompreendidos do grande François Truffaut. Afinal ambos os filmes tratam de crianças, em um período de dificuldade e pânico das suas vidas. Só que o filme de Truffaut não é para toda a família, e nem poderia ser. Truffaut faz uma análise da infância estritamente direcionada aos adultos. Aqui Laurent (longe de querer ser um Truffaut) pinta a infância com cores claras e com gosto de naftalina.

O nosso Doinel, no caso, Nicolau, é irrepreensívelmente interpretado por Maxime Godart (a nouvelle vague também está presente nos atores, perceberam?). O menino é uma graça de pessoa. Assume uma expressão altiva, um riso sincero. Ele passa autenticidade até mesmo em cenas onde se requer mais interpretação. Para citar um exemplo, repare na sua expressão na cena em que seus pais estão discutindo, após ele ter "tentado" limpar a casa.


O resto do elenco também está impecável. Para montar a turma de Nicolau, Tirard (que assina o roteiro ao lado de Grégoire Vigneron) faz um painel de uma típica sala de aula. Temos o garoto arrogante, o nerd, o comilão... todos têm interpretações formidáveis. Claro, que eles têm seus pontos fracos, mas isso não arranha nem um milímetro na obra. Além disso, o elenco adulto está ótimo (observe nas expressões da mãe de Nicolau).

Claro que o filme têm suas ressalvas, principalmente no que diz respeito ao roteiro. Algumas cenas parece que foram feitas especialmente para servirem de escada para as piadas. Entretanto elas se encaixam, mesmo que manchando a honestidade que mencionei no início do texto, no contorno do filme. Isso é bom, mas poderia ser melhor.

No final, Nicolau não é um Doinel da vida, como eu afirmei anteriormente. Apesar de também fugir de casa e voltar para o seio da família, ele não tem as mesmas desventuras da personagem interpretada por Jean-Pierre Léaud. Nicolau se assemelha mais com O Menino Maluquinho. Aliás, todos tem suas disfunções mentais (no bom sentido, se é que há um bom sentido nisso). Essas "maluquices" são perfeitamente exploradas durante o filme, e rendem a melhor cena da obra: a cena em que eles fazem o teste de Rorschach.

Tirard faz neste filme faz um trabalho excelente. Óbvio, tem todas as falhas e clichês do gênero, mas isso é uma coisa que não se pode evitar.

Nota: 4 estrelas em 5

Por Victor Bruno

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