sábado, 20 de novembro de 2010

Livros - Tito Andrônico, de William Shakespeare

De longe o trabalho mais sangrento de Shakespeare. Ao todo são dois personagens mutilados (um tem as duas mãos decepadas, fora a língua e outro tem o braço direito cortado fora), duas decapitações, uma cena de canibalismo involuntário e muitas, muitas mortes...

Agora, não que a peça seja ruim. Shakespeare, de praxe, acerta ao justificar a violência. A mesma violência justificada no final de Hamlet (tanto na peça como nos filmes), mas elevada à enésima potência. Shakespeare utiliza a violência como forma de aliviar as tensões e frustrações das suas personagens, nas mais variadas maneiras. Tito trama uma vingança diabólica. Quinron e Demétrio cometem um estupro por que não conseguiram a mulher que queriam. Tamora faz maldades durante todo o texto para vingar seu filho Alabrão, que é cruelmente assassinado por Tito em nome da religião.

O texto é cru e tingido de vermelho-sangue. É quase indigesto. Com uma abordagem errada você pode repetir o feito de Peter Brook em 1955, quando mandou dezenas de pessoas para o hospital durante uma apresentação extremamente gráfica da peça.

Mas, citando a tradutora do texto para a L&PM, Beatriz Viégas-Faria, "Tito Andrônico é uma peça tão artisticamente atual quanto um filme dos irmãos Coen (Fargo, por exemplo)". Violência é um tema atual. Eu não compararia esse texto com Fargo, mas sim com um filme de Quentin Tarantino. Aqui Shakespeare trata a violência de forma tão banal quanto o diretor de Knoxville. Aliás, a Reduced Shakespeare Company se referiu à esta peça como "Shakespeare em sua fase 'Quentin Tarantino'."

E faz sentido.

Para o cinema, a maior adaptação da peça foi dirigida por Julie Taymor, com Anthony Hopkins no papel principal. Taymor optou por situar a peça não em um único ponto na história. Há vários anacronismos no visual do filme (liberdade artística, primo). Por exemplo, você poderá ver numa mesma cena (além de sangue escorrendo) um soldado romano, uma Halley-Davison, um soldado vestido com roupas fascistas, etc. É interessante. É uma fantasia visual que Julie Taymor constrói ao longo dos 162 minutos de filme. Entretanto a violência que ela impõe no filme é incomodativa. Chuta o cérebro de quem vê. Mas, bom, era exatamente o que Shakespeare queria: sangue, sangue e mais sangue.

Sim. É Shakespeare em sua fase "Quentin Tarantino".

Por Victor Bruno

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