segunda-feira, 25 de julho de 2011

O Informante

The Insider, 1999 / Dirigido por Michael Mann
Com Al Pacino, Russell Crowe, Christopher Plummer, Philip Baker Hall, Debi Mazar e Diane Venora

5/5

Fazer filmes investigativos não é fácil. Fazer filmes românticos, comédias, policiais, filmes de super-heróis é mais simples. Basta uma personagem carismática e um pequeno problema em frente e um escritor que consiga cativar o público por duas horas e a receita está feita. Já num filme investigativo – principalmente um com uma estrutura como a deste O Informante – existe uma batelada boa de problemas para atores, roteiristas e diretores resolverem. Como amarrar de forma uniforme e homogênea problemas pessoais, informações e ainda – de quebra, como se já não bastasse – a paciência dos espectadores? Espectadores são animais famintos por diversão e entretenimento – seja ele inteligente ou não. Logo, não é de se admirar que esta obra-prima de Michael Mann (de Fogo contra Fogo e Inimigos Públicos) tenha fracassado miseravelmente nas bilheterias, conseguindo devolver apenas 60 milhões do seu orçamento de 90 milhões.

Mas não é isso que se importa. O Informante é um raro caso de filme que consegue em suas duas horas e quarenta minutos de filme cativar o público e fazê-lo contorcê-lo na poltrona. Quando se conta uma história como a de – Jeffrey Wigand um cientista ex-pesquisador da Brown & Williamson, uma poderosa indústria do tabaco norte-americano – existe muito em jogo. Trata-se de uma história perturbadora, que mexe com grandes nomes do jornalismo e da economia americana. Para citar um exemplo, uma das personagens chave do filme é o (ainda vivo e influente) ex-âncora do lendário programa 60 Minutes, Mike Wallace.

Vou ser direto ao ponto: Jeffrey Wigand (Russell Crowe) é um homem que sabe demais. Após ser demitido de seu confortável posto da Brown & Williamson, resolve revelar ao mundo que a sua ex-empresa anda operando de maneira ilícita. Wigand –entendedor das coisas – sabe que a empresa anda colocando amoníacos – entre outros elementos químicos – em seus cigarros, para que o vício dos usuários aumente. Wigand – um antitabagista notório – resolve levar essa história ao público.

Mesmo que em contrato de sigilo com a empresa – que sabe que Wigand pode dedurá-los a qualquer segundo –, Wigand entra em contato com Lowell Bergman (Al Pacino) – produtor do 60 Minutes. E é neste exato minuto que a tensão do filme começa. Mann nos põe desde o primeiro segundo de projeção num permanente estado de alerta.

Optando por começar sua história fora de ambiente, Mann nos dá – de forma simples, mas eficiente – o perfil de cada uma das suas personagens. Por exemplo, o filme abre com uma sequência no Oriente Médio, numa entrevista produzida por Lowell Bergman para o 60 Minutes. Enquanto Mike Wallace – que se mostra rapidamente um jornalista arrogante, capaz de soltar pérolas como “Quem te disse que os teus dedinhos incompetentes têm o talento necessário para me editar?” – briga com os soldados do Hezbollah sobre o lugar onde irá se sentar; Lowell, de forma diplomática, fala diretamente com o Aiatolá e resolve tudo de forma simples – o que rapidamente mostra que Lowell, além de controlado, tem um impressionante talento persuasivo, o que será extremamente importante no decorrer da história.

Na contra-mão nós temos a personagem de Russell Crowe, o homem marcado. Observe sua primeira aparição. Wigand anda sempre cabisbaixo, olhando para trás, de forma inclinada. Ele é uma persona non grata, e nós não precisamos de nenhuma palavra para sacarmos isso, basta prestar atenção nas ações das personagens que o cercam. A direção inteligentíssima de Michael Mann nos encarrega de fornecer todos os detalhes: Veja que assim que Wigand sai do hall do prédio da Brown & Williamson, um segurança comunica (discretamente) a sua saída, via walkie-talkie.

De todas as maneiras, O Informante é uma meditação. Uma meditação inteligentíssima sobre o comportamento de dois homens distintos a uma mesma situação. O roteiro hábil de Roth e Mann explora todas as facetas de todas as personalidades de suas personagens, Wigand (nesta linda atuação de Russel Crowe, que, ao lado de Philip Seymour Hoffman é um dos atores mais competentes – e elegantes – desta geração) é um homem controlado, apesar de confessar ser explosivo. É até surpreendente quando o vemos falar “Fuck”, por que, sinceramente, é a última coisa que nós poderíamos esperar de uma pessoa como Wigand, simplesmente por que Wigand é o supra-sumo da elegância. Aliás, basta dar uma olhada nas cenas em que ele compartilha a tela com Al Pacino. Enquanto Lowell Bergman está quase sempre de cabelo assanhado e roupas amarrotadas, Widget está sempre com o cabelo impecavelmente penteado e sempre de terno passado (é digno de nota registrar que são pouquíssimas vezes que o vemos sem terno). Tanto direção como roteiro sabem que são dois homens distintos. Note que enquanto a casa de Bergman está banhada em cores quentes e acolhedoras, a (nova) casa deles é filmada afogada permanentemente numa paleta de cores frias, normalmente com a cor azul. (Eu poderia sim dizer que é simplesmente um cacoete de Mann, coisa que qualquer um que assista Miami Vice pode notar, mas no caso a constatação se aplica.)

O Informante é um filme sem medo de explorar as coisas. É até louvável (e um pouco impressionante) que a Disney tenha deixado Mann fazer um filme como esse. Vejamos: Eric Roth e Michael Mann exploram de forma extremamente eficiente os bastidores da notícia e das grandes corporações (algo que é digno de aplausos). Sem medo de mostrar Mike Wallace como um homem preocupado com o seu legado (o que o leva a concordar com Don Hewitt, produtor executivo e criador do 60 Minutes quanto a não-exibição da bombástica entrevista de Wigand) e Al Pacino como um homem de saco cheio (“Dá um tempo, porra!”), Roth e Mann ainda conseguem explorar a vida familiar, tanto de Bergman como de Wigand, o que nos leva a torcer ainda mais por eles.

Adotando um estilo realista – quase documental – Mann consegue fazer que essa exploração seja ainda mais eficaz. O fotógrafo Dante Spinotti faz um trabalho muito inteligente. Para nos manter sempre próximo das personagens do filme, Spinotti utiliza lentes chapadas, o que diminui a profundidade de campo, além de optar pelo uso da hand-held cam (recurso que não gosto, mas foi utilizado de forma eficaz e elegante neste filme), colocando a câmera a centímetros do rosto dos atores, o que aumenta a sensação de presença (deve ser extremamente desconfortável atuar com a lente da câmera tocando no seu queixo), repare também como as sombras são uma presença constante, e se sobrepõem as personagens. E é justamente quando Mann e Spinotti abandonam o estilo realista que o filme tem sua pior cena. Não vou dizer qual é, mas é risível.

Distanciando-se do expoente máximo do filme do gênero jornalismo investigativo, Todos os Hoemns do Presidente (All the President’s Men, 1974), O Informante não romantiza o jornalismo. Ao contrário do Washington Post daquele filme, a divisão de notícias da CBS – ao que parece – não preza tanto pela credibilidade da notícia que leva ao seu espectador – e isso quando leva, o que leva o filme a colorir aquele ambiente de forma fria. De fato, o único fator que aproxima Todos os Homens do Presidente e O Informante é, somente, o ótimo design de produção de Brian Morris.

O Informante é um conto da força de vontade. Aliás, não há forma melhor de descrever o filme, senão citando o próprio Lowell Bergman: O Informante é um filme sobre “gente ordinária sob mais pressão que podem suportar.”

Por Victor Bruno
25/07/11

1 comentários:

Excelente filme.
Prende a atenção do início ao fim.

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