domingo, 3 de abril de 2011

Um Violinista no Telhado





Fiddler On The Roof, 1971/ Dirigido por Norman Jewison
Com Topol, Norma Crane, Paul Mann, Leonard Frey e  Rosalind Harris.

4/5

"Tradição". Talvez nenhum outro filme tenha abordado de forma tão profunda a ligação de um povo com suas tradições quanto "Um Violinista no Telhado", adaptação da peça homônima da Broadway escrita por Joseph Stein. Desde a primeira belíssima seqüência do filme, em que a câmera passeia pelo vilarejo de Anatevka mostrando o cotidiano de seus moradores, com a narração em off do personagem Tevye invocando a importância da tradição, fica claro que este não é um musical qualquer. Ainda mais tendo como diretor Norman Jewison, um tanto desconhecido de nome pelo público brasileiro, mas que realizou diversos ótimos filmes ao longo de sua carreira, como "No Calor da Noite", "Jesus Cristo Superstar" e, é claro, o mais famoso deles, "Um Violinista no Telhado".

Tanto o filme como a peça original se passam no mesmo lugar e no mesmo momento histórico: o vilarejo de Anatevka, na Rússia Oriental, com maior parte da população de origem judaica, na virada do século XIX para o século XX. Tevye (o ator grego Topol, ótimo), é um leiteiro pobre, que vive com sua esposa e cinco filhas em uma residência humilde, e preza sobretudo pelo respeito aos antigos costumes de seu povo. Assim, ele se vê como o responsável pelo casamento das filhas, pelo sustento da família, e pela realização do Sabá. Contudo, tudo começa a mudar na vida de Tevye e dos seus vizinhos judeus quando o governo do czar começa a lançar mão de políticas anti-semitas, desafiando todas as tradições daquele povo.

Para compreender melhor as interessantes reflexões mpropostas pelo roteiro de Joseph Stein, é possível utilizar a disitnção elaborada pelo historiador inglês Eric Hobsbawn, no livro "A Invenção das tradições". Hobasbawn considera que existem dois tipos de tradições: as inventadas, geralmente para algum fim político ou de Estado (como datas nacionais, desfiles cívicos anuais, etc.) e as genuínas, que remontam a algum passado distante, e não é possível saber exaatmente como elas surgiram. E é revelador notar como as tradições judaicas apresentadas no filme se encaixam nesta segunda definição do historiador. Para exemplificar, há uma fala genial de Tevye logo no início, na qual ele afirma: "Você pode perguntar quem inventou esta tradição. Eu lhe digo. Eu não sei. Mas é uma tradição." E não interessa para Tevye e para aquele povo daonde vêm as tradições; o importante é simplesmente cumprí-las, para que a sociedade continue funcionando.



Mas os primeiros dilemas para Tevye surgem com relação ao casamento de suas filhas. A primeira se nega a casar com um rico viúvo, porque ama um colega de infância pobre; a outra quer se casar com um universitário de idéias "revolucionárias"; e a terceira pretende se casar com um não-judeu. Tudo isto começa a colcoar o mundod e Tevye de "cabeça-para-baixo", o que é muito bem explorado pelo roteiro, que dá atenção a cada um dos personagens, e nenhuma das três situações parece artificial. Ao mesmo tempo, o panorâma histórico-social, com as medidas claramente anti-judaicas do czar, dá um fundo político que enriquece ainda mais a trama.

Este bom roteiro é trabalhado de maneira brilhante pelo diretor Norman Jewison. A primeira seqüência, já citada acima, é um primor, e pode ser colocada lado a lado em termos de estilo  e qualidade com um outro momento quase no fim do filme, quando os judeus são expulsos de Anatevka. A câmera de Jewison, desta vez, passeia pelo vilarejo, mostrandoa  extrema tristeza em que cada um dos moradores se encontra, inclusive se valendo do uso de diversos closes que ressaltam ainda mais a situação de melancolia. É também uma marca do diretor utilizar muitos planos abertos, o que é ainda mais favorecido pela belíssima fotografia.



Em se tratando de um musical, não há como deixar de falar das músicas. E "Um Violinista no Telhado" é recheado de canções maravilhosas, tanto em termos de melodia, quanto nas letras. A primeira, "Tradition", já foi citada acima, mas ainda temos as espetaculares "If I Were a Rich Man" (possivelmente a melhor de todas, com o personagem Tevye imaginando como a vida seria caso fosse rico); "Sabbath Prayer" é lindíssima, uma oração cantada por Tevye e sua esposa na celebração do Sabá; e "Sunrise, Sunset" é uma das mais conhecidas, e a mais bela em melodia. Aqui também vale a destacar a cena do sonho de Tevye, com a música "Tevye's Dream"; em um primeiro momento, esta cena, que se passa em um cemitério com vários zumbis, pode parecer destoante do resto do filme, mas a execuação é tão bem-humorada e com uma coreografia tão contagiante, que é impossível não se ver apaixonado por esta seqüência.

Mesmo para quem não gosta de musicais, "Um Violinista no Telhado" é um programa obrigatório, um exemplo de bom roteiro, direção segura, e trilha sonora espetacular, aliando uma trama profunda e séria, com momentos leves e extremamente divertidos. Dá até vontade de sair cantando com Topol: "If I were a rich man, Ya ha deedle deedle, bubba bubba deedle deedle dum. All day long I'd biddy biddy bum. I f I were a wealthy man.". 

 Por Douglas Braga

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