segunda-feira, 4 de abril de 2011

Sobre Rango, Misirlou e menstruação

Lembrei-me de um fato curioso que aconteceu quando assisti a Rango (Rango, 2011), há cerca de duas semanas atrás. Durante os vibrantes créditos finais do filme, escutamos uma animada música que, na verdade, é uma variação da famosa “Misirlou”, aquela música que toca no início de Pulp Fiction (Pulp Fiction, 1994). Pois bem, quando eu estava saindo da sessão escuto alguém ao meu lado dizer: “Olha! Eu já escutei essa música!”. Daí uma garota respondeu: “Eu sei. Essa música é do Black Eyed Peas.”

Obviamente, eu senti vontade de corrigir a garota. “Não, essa música não é “Pump It”. Ela é de um filme chamado Pulp Fiction e blá, blá, blá...” Senti vontade de corrigi-la, mas não o fiz. Para começar, nem conheço a garota. E mesmo se conhecesse, ainda não o faria. “Poxa, que cara mais chato, hein? Só que ser o bonzão e tal. 'Não é 'Pump It', ele diz.” E de todas as maneiras, quem se importa se foi ou não o maldito Balck Eyed Peas que compôs ou não “Misirlou”? Além do mais, se eu dissesse que essa música veio de Pulp Fiction eu estaria errado. Misirlou é uma música tradicional grega.

Mas não importa. Eu não vim aqui perder meu tempo para falar sobre o que eu faria ou não. De todas as formas, essa peculiar situação me chamou a atenção. É sobre cultura pop. Se Rango tivesse sido lançado há uns... talvez dez, doze anos atrás, certamente todos chamariam Gore Verbinski de preguiçoso. De diretor sem criatividade, embarcando na onda pop de Quentin Tarantino utilizando a sua trilha sonora de sucesso para se autopromover. Hoje... bem, ninguém reclamou da sua trilha sonora, mas também não falaram mal. Mas é interessante ver como Verbinski utilizou em seu filme variações de excelentes trilhas sonoras (como aquelas compostas pelo proeminente italiano Ennio Morricone) para fazer uma trilha homogênea e animada.

Só que ninguém percebeu. Naquela mesma sessão, eu falava em voz alta e animado as referências que eu encontrava no filme. Eu falei “Olha, se parece com Lawrence da Arábia!”, mas escutei somente o som do silêncio. Depois eu sussurrei “Como em Era Uma Vez no Oeste!” Silêncio.

Confesso que fiquei transtornado. Ninguém percebeu? Não. Ninguém notou as referências à Apocalypse Now, Star Wars, nada. Mas, de certa forma, isso constata um fato que parece ser bem sintomático nesses dias secos: Estamos ficando mais ignorantes. Não estou dizendo que estamos ficando burros, mas culturalmente ignorantes. A menina que disse que a música era do Black Eyed Peas, claro, não tem culpa de não conhecer “Misirlou”. Ela sequer tem a obrigação. Já eu tenho culpa de conhecer, por que assisti Pulp Fiction e ouvi a trilha sonora. Quem está nadando corrente aqui sou eu, e todos que assistiram ao filme de Tarantino. E eu também não tenho a menor sombra de dúvidas de que se aquela menina assistir a Pulp Fiction ela dará um pulo e dirá “Olha, e a música do Black Eyed Peas”, e continuará pensando que é performada pelo Black Eyed Peas, por que não teve a curiosidade de ver que é do Dick Dale. Eu te juro, leitor, eu te juro que o susto dela será como o susto de Carrie em Carrie, a Estranha (Carrie, 1976) quando menstruou pela primeira vez e achou que estava morrendo. Tudo isso só por que a mãe era tão puritana ao ponto de negar educação sexual para a filha.

E agora, José? O que faremos para acabar com essa ignorância? Minha sugestão – expliquem às suas filhas o que é menstruação.

Por Victor Bruno

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