quinta-feira, 31 de março de 2011

Onde Vivem os Monstros

Where the Wild Things Are, 2009 / Dirigido por Spike Com Max Records, Pepita Emmerichs, Catherine Keener, Paul Dano, Catherine O'Hara, James Gandolfini, Forest Withaker, Lawren Ambrose e Mark Ruffalo.


(5/5)


"Havia alguns edifícios muito altos que podiam andar. O mais alto deles é mordido por um vampiro que perde os dentes após o ataque e chora. Outros vampiros perguntam o motivo do choro e ele explica que perdeu seus dentes, e não eram de leite. Então os vampiros o deixam porque não poderia ser mais um vampiro".

Complexo demais para crianças – às vezes até mesmo para adultos –, Where The Wild Things Are mostra o poder da imaginação como nunca visto antes, sendo que, antes, a experiência foi “Alice no País das Maravilhas”, que encantou o público ao mesmo tempo em que perturbou algumas crianças com seu ritmo frenético e desolador.

Where The Wild Things Are tem a mesma fórmula, mas cativa milhões de vezes mais que “Alice no País das Maravilhas”. Sem pressa, o filme mostra a vida de Max, um menino de nove anos, infeliz e solitário, mas com uma imaginação fértil, algo que está ficando cada vez mais raro com o mundo tecnológico de hoje (lembrando que diretores de filmes como Gamer, Trasformers 2 e G. I. Joe já tiveram infância). Naturalmente os conflitos do pequeno Max são postos na tela: falta de atenção por parte dos próximos, que, aparentando compreender o filho, não fazem nenhum esforço para ajudá-lo. A falta de atenção, a exclusão, geram o isolamento, que faz com que Max tenha uma imaginação mais fértil que o normal – ou até mesmo normal –, fazendo com que ele crie histórias e mundos incríveis.

Talvez o momento em que Max conta a história do vampiro e do prédio para sua mãe ocupada seja a parte mais humana e tocante do filme – o filme por inteiro é humano, algo raramente visto em filmes hoje em dia. Essa história, apesar de triste e desoladora ao extremo, não toca a sua mãe como deveria vindo de uma CRIANÇA. Isso não abala ao certo Max, pois está acostumado com essa reação vinda de seus próximos e não tem consciência de que a história que contara é muito além do que uma criança “normal” costuma a contar.

Depois de tentar chamar a atenção de sua mãe que trouxe um aparente novo namorado para casa e estava em meio a um encontro, Max foge para uma floresta sem querer olhar para trás e encontra, na margem de um rio, um barquinho de vela, onde sobe a bordo e parte pelo rio até o mar. As expressões de Max são o ponto máximo do personagem. Max transmite hesitações em quase todos os momentos em que tem de tomar uma decisão, mostrando insegurança e a pouca experiência que tem de se relacionar, principalmente quando a decisão envolve não só ele, mas outras pessoas.

Depois do mar, Max encontra uma ilha onde deixa o barco e caminha pela floresta, em fim encontrando os “Monstros”. Os monstros são na verdade todas as personalidades de Max, todos os seus sentimentos, principalmente Alexander (dublado por Paul Dano, de Little Miss Sunshine), que é o sentimento mais próximo de Max. Alexander é pequeno e procura atenção a todo o momento e é ignorado pelos demais.

Os ‘monstros’ são: Carol, o mais complexo de todos os personagens, com momentos de extrema alegria e outros de alegria misturada com raiva, como um ataque depressivo, como quando Max os encontra pela primeira vez, onde Carol está destruindo as casas de todos os monstros aparentemente alegre e Max não entende ao certo se o que está acontecendo é certo ou errado; Douglas é o melhor amigo de Carol, com certeza o melhor amigo de todos. Por vezes o mais inteligente e maduro, mas que não demonstra liderança, pois é sábio e sabe que uma liderança muito certa no meio daqueles seres tão diferentes seria algo impossível; Ira é o mais velho e o que toma conta de todos, como um pai, sendo que a mãe é Judith, uma fêmea com uma personalidade estranha, que varia, assim como Carol, mas que quer toda a atenção para si e não pensa em conseqüências; Alexander, pode-se dizer, é Max, o ignorado, frágil, o mais baixinho e o que necessita de mais atenção; O Touro é aparentemente um peso morto, apenas um membro mudo da família de monstros que não interfere em nada, mas sempre está presente, é amigo e faz tudo o que o mandam fazer; por fim, KW é a mocinha, que tem uma relação complicada com Carol e há pouco tinha deixado o grupo, cansada das variações repentinas de emoções de Carol (o diretor foi inteligente em manter esse relacionamento escondido, sem dar muitas pistas, sem deixar claro ao expectador o que realmente está acontecendo, fazendo-nos sentir tudo como se fôssemos um estranho – ou seja, como se fôssemos o Max).

Max então, aparece para os monstros que ameaçam devorá-lo, mas não o fazem, pois Max diz que tem grandes poderes e que é temido por povos longínquos como o povo dos Vikings. Sendo assim, os monstros tornam Max um rei. A partir desse ponto, o filme é extremamente cativante, mostrando a relação entre os monstros de extremo companheirismo, uma sensação de família raramente transmitida no cinema, talvez nunca mostrada como nesse filme. Amizade, aconchego, aproximidade. Mas tudo isso numa espécie de aquário de vidro fino, onde o menor erro pode ocasionar uma guerra entre essa família, principalmente vinda de Carol. Jonze passa as mais puras sensações e fantasias de uma criança de forma única e reflexiva.

Quanto ao visual, é mágico! Spike Jonze filma todo o filme com a câmera na mão, dando uma sensação de realidade impressionante, como se participássemos dele, desde as brincadeiras até as intrigas. Nós vivemos o filme! E Spike Jonze (diretor de Being John Malkovich e Adaptation) cria o mundo de Max com extrema precisão e realismo que é difícil não se emocionar, junto à bela trilha sonora, paisagens e claro, os monstros.

Por Pedro Ruback

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