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(5/5)
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Para Victor Bruno, a última parte da saga de Harry Potter não é nada demais, nem nada de menos. Apenas o suficiente
A saga de Harry, Hermione e Ron chega ao fim e Douglas Braga não gosta nada da sua conclusão
Na última parte do Especial, relembre o que Victor Bruno escreveu sobre A Rede Social, mais recente filme de David Fincher
Victor Bruno faz uma análise de O Curioso Caso de Benjamin Button, no penúltimo filme comentado neste especial
O nosso especial sobre David Fincher continua com Douglas Braga falando sobre Zodíaco, mais um thriller investigativo do norte-americano
Aí em cima está o primeiro screenshot! Está fácil!
Por Victor Bruno
Ao que parece, Terrence Malick (Além da Linha Vermelha, Dias de Paraíso) descobriu a importância do marketing na divulgação de um filme. Dito isso, eis o novo pôster para o seu velho-novo filme: A Árvore da Vida (The Tree of Life). “Velho-novo filme”? Sim, o neologismo pode ser perfeitamente aplicado, já que está sendo preparado desde o ano de 2007.
A Árvore da Vida também chega com mais novidades no que diz respeito a sua divulgação. O filme também ganhou um site (que pode ser acessado clicando aqui) e um Tumblr (aqui). O filme estreia em 27 de maio, nos Estados Unidos, e em 1o de julho aqui no Brasil.
Clique aqui para ver o pôster.
Da Redação
Não é que eu não tenha ligado para a morte de Elizabeth Taylor. Apenas admiro-a demais para publicar coisas como “vá em paz”, ou homenagens, ou linhas do tempo sobre sua carreira. Simplesmente acho mais interessante achar curiosidades ou depoimentos de quem conviveu com ela, para então repassar para você, leitor. (Até por que você pode encontrar linhas do tempo melhores e mais bem elaboradas do que qualquer uma que eu me propusesse a fazer em sites como o Cineplayers, Cinema em Cena e/ou no The New York Times.)
Mas este post não procura explicar nenhuma suposta “falta de interesse” minha na morte de Liz Taylor. Eu venho postar um vídeo que encontrei na Internet. Um tributo de Paul Newman (Um Golpe de Mestre, Gata em Teto de Zinco Quente) à Elizabeth Taylor, que foi exibido no TCM há alguns anos atrás.
Nunca me esquecerei. Acho que para todos os cinéfilos, este deve ser um momento histórico, quiçá sagrado – o seu primeiro Kubrick. Assistir pela primeira vez um filme de Stanley Kubrick deve ser como perder a virgindade. OK, eu estou exagerando. Assistir a um Kubrick é mais emocionante. Mas isso não importa agora. Gostando ou não, o primeiro Kubrick é algo inesquecível, aterrador. Martin Scorsese diz que assistir a um filme de Stanley Kubrick é como subir numa montanha, olhar a paisagem. Inevitavelmente você exclamará “Nossa, que vista!”. Scorsese, para variar, está corretíssimo.
Eu não exclamei “Nossa, que vista!” quando assisti meu primeiro Kubrick. Devia ter uns sete, oito anos quando isso aconteceu. Era uma noite de sábado, no início da década passada. 2002, 2003... eu sei lá. Só sei que o filme que estava passando era Nascido Para Matar (Full Metal Jacket, 1987). Se eu fosse quem sou hoje (um cinéfilo patológico) naquela época, teria dito que aquilo era anormal. “Stanley Kubrick na TV aberta?!”. Provavelmente não teria assistido, já que o filme – naturalmente – passaria dublado. E passou. Mas é como eu disse há alguns dias atrás, no Twitter: Kubrick é Kubrick até debaixo d'água, assim como Linda de Um Pistoleiro Chamado Papaco é mulher até debaixo d'água.
O filme estava dentro do “Festival Stanley Kubrick”, no Cine Belas-Artes (a sessão de Cinema, não o finado cinema Cine Belas-Artes). Na semana seguinte passariam O Iluminado (The Shining, 1982). A chamada daquele maldito filme já me apavorava. Sério, pouco menos de 30 segundos, basicamente o narrador dizendo “Um dos filmes de terror mais aclamados de todos os tempos. Do diretor Stanley Kubrick: O Iluminado”.
De todo modo, eu estava fascinado. Se estou bem lembrado, naquela noite assisti até a cena em que Jocker explica por que diabos ele usa um capacete em que se lê “Born to kill” e um botton pacifista. E já naquela época eu havia percebido algo que críticos e espectadores julgavam como certo e como universal: A primeira parte de Nascido Para Matar é infinitamente melhor que a segunda.
Melhor pode até não ser, mas é claramente mais divertida. A primeira é uma tortura psicológica quase interminável. “É como ir para o ringue e enfrentar os punhos de Mike Tyson”, como bem disse o crítico Sérgio Vaz, em um esclarecedor texto sobre o filme publicado em 1988, e que pode ser lido no seu – excelente – site 50 Anos de Filmes (o texto pode ser lido aqui). E você pode me chamar de masoquista, mas se os socos de Tyson forem tão agradáveis quanto assistir a Full Metal Jacket numa inesperada noite de sábado, quero ser esmurrado agora. (E quem sabe ser um Evander Holyfield Júnior e ter um pedaço da minha orelha cortada e mastigada.)
E foi certo. Final de semana seguinte estava eu na locadora (sim, locadora!), locando este filme. Algumas horas mais tarde eu estava o revendo. Podia não estar entendendo nada, nada dos temas que Kubrick queria tratar. “Dualidade humana”? Pro inferno com “dualidade humana”, senhor! Massacre das mentes dos jovens na guerra? Que se dane isso também! Eu estou vendo o que eles chamam de “obra-prima”.
Eu não sabia quem era Stanley Kubrick. Só consegui compreender o que – e quem – era ele alguns anos mais tarde, quando assisti a 2001 – Uma Odisseia no Espaço. E, como metade dos adolescentes, não gostei. Eu esperava o quê? Sei lá. Um Star Wars da vida. Um filme que tem “Odisseia no Espaço” no título, e começa na Pré-História? Só então vi que este Stanley Kubrick era o mesmo Stanley Kubrick que havia feito Laranja Mecânica, filme que eu havia visto algumas semanas antes, e amado, amado, amado.
Mas é assim. Stanley Kubrick faz parte da minha gênese cinéfila, bem como Carol Reed, Paul Thomas Anderson, Quentin Tarantino e Terrence Malick, também. Mas Kubrick é algo mais nostálgico. Por isso fiz questão de assistir de assistir De Olhos Bem Fechados no SBT, dublado, no último sábado. Você sabe – sábados sempre são sábados.
Por Victor Bruno
O mundo da animação atual parece ser dividido em dois segmentos: os filmes Pixar e os não Pixar. Dentro do filão “não Pixar” existem dois subgrupos: os DreamWorks e o resto. Pois é dentro do “resto” em que nós encontramos pérolas como Rango. Pérolas raríssimas, diga-se de passagem. Contam-se nos dedos quantas vezes nós podemos ver filmes como este serem lançados anualmente. Filmes da qualidade técnica e com a sensibilidade de Rango. De um jeito bem simples, podemos dizer que esta obra de Gore Verbinski (de O Sol de Cada Manhã e da série Piratas do Caribe) é quando a sensibilidade e o primor técnico de O Fantástico Sr. Raposo (The Fantastic Mr. Fox, 2009) se encontram com o humor amalucado de Deu a Louca na Chapeuzinho (Hoodwinkled!, 2005). E esses filmes são excelentes.
Mas é preferível estar do lado de Raposo de Wes Anderson (A Vida Marinha com Steve Zissou, Viagem à Darjeeling) do que do lado de Chapeuzinho de Cory Edward. Raposo, além de ter uma plasticidade incrível (como é habitual na filmografia do seu diretor), realiza um estudo de personagem brilhante, ainda que meio acanhado. Lá o Sr. Raposo do título queria escapar da sua própria natureza. Queria ser uma raposa anti raposa, enquanto Deu a Louca na Chapeuzinho divertia seu público simplesmente fazendo uma subversão do gênero dos contos-de-fada. Não que isso não tenha seus devidos méritos. É interessantíssimo, além de arrancar grandes gargalhadas com seus momentos de comicidade. Só que o filme de Wes Anderson é mais corajoso e elegante. Afinal de contas, quem é o cineasta que faz análises psicológicas de seus personagens num filme cuja mídia é dominada pelas crianças, que estão se lixando para análises psicológicas. Mas é engraçado, por que a Pixar faz isso, e... bem, Toy Story 3.
Aqui nós temos algo similar. Com roteiro de John Logan (o mesmo roteirista de O Aviador e do próximo filme de Martin Scorsese, Hugo Cabret), baseando-se numa estória criada por Verbinski, James Ward Byrkit e pelo próprio Logan, o filme segue um camaleão (Johnny Depp) que, após um acidente de carro, perde a proteção da sua caixinha de areia e dos seus dois melhores “amigos” (um peixe mecânico e uma bonequa Barbie sem cabeça e sem roupas) e vai parar na seca e poeirenta cidade de... Poeira. Chegando lá, o camaleão – e o público – conhece uma situação extremamente caótica e miserável. Não há água em Poeira. Os cidadãos estão na mais absoluta seca. O último reduto de água que resta em Poeira é guardado à sete chaves pelo banqueiro da cidade: um enorme galão de água onde existe a marcação de dias que faltam para a água acabar.
Desde cedo o camaleão é avisado que não vai durar muito, seja pelo grupo de corujas mariachis que tocam a trilha sonora do filme (o tema, composto pela banda Los Lobos, é genial!), seja por Priscilla (voz de Abigail Breslin). Não importa, os prognósticos são os piores possíveis. Mas logo a situação muda. Depois de mentir, mentir e mentir mais ainda numa briga no clássico saloon da cidade (qual cidade do Velho Oeste não tem um saloon?), o camaleão, que agora adota o nome-fantasia de Rango, rapidamente transforma-se no herói da cidade, após matar acidentalmente a águia que ameaçava a todos, mocinhos e malvados, na cidade de Poeira. Mas os problemas estão longe de acabar. Portanto, o sinistro Prefeito (Ned Beatty), promove Rango ao cargo de xerife. Tudo bem, certo? Errado. A água da cidade some e o banqueiro é encontrado morto. Rango agora tem que fazer de tudo para sustentar a personagem que criou (afinal, ele nunca foi um pistoleiro na vida, muito menos sabe quem é) e manter a esperança de uma comunidade que já não tem mais em quem, ou o que, acreditar.
Aliás, o tema da crença em Rango é uma constante. O roteirista Logan modela a fé de diferentes formas dentro do seu filme. Se a aterrorizada comunidade de Poeira tem na fé e na esperança suas últimas chances de sobrevivência, já que a água parece algo tão distante e inalcançável, o Prefeito utiliza-se da fé para enganar sua comunidade. Numa cena particularmente brilhante do filme, ele diz: “Bem, Sr. Rango, as pessoas têm que acreditar em alguma coisa. Acreditar... acreditar. Acreditar em algo”. E Rango, por sua vez, acredita realmente que é um justiceiro que veio para salvar a pele da gente miserável de Poeira. Afinal, Rango é apenas um camaleão em séria crise de identidade. Uma crise tão séria que, quando indagado por Priscilla sobre quem ele é, Rango gagueja, gagueja... mas não consegue responder.
Mas talvez o que seja mais interessante dentro da obra de Verbinski (diretor extremamente versátil, por quem tenho uma profunda admiração desde que vi o tocante O Sol de Cada Manhã, com Nicholas Cage) sejam as referências cinematográficas inseridas neste filme. Elas começam desde... o próprio Rango. Veja como a camisa de Rango é idêntica a camisa que Raoul Duke (também interpretado por Johnny Depp) em Medo e Delírio (Fear and Loathing in Las Vegas, 1998). Também reparem nos dois caras que dirigem o conversível que atropelam Rango. São os próprios Duke e Gonzo, de Medo e Delírio.
Felizmente o filme não se atém apenas nestas referências ao Cinema. Rango homenageia principalmente ao Western e ao Western spaghetti, gênero que revelou lendas do cinema como Clint Eastwood, Terence Hill, Sergio Leone, Franco Nero e tantos outros. Observe, por exemplo, a cena do duelo entre Jake Cascavel (Bill Nighy) e Rango. Os cortes nos olhos dos atores, assim como Leone fazia, para acentuar a tensão. Além de ser uma referência inteligentíssima, Verbinski realmente acentua a tensão realizando este jogo visual. Repare também como o Prefeito, apesar de estar em sua cadeira de rodas, ainda exala poder por todos os seus poros, tal qual Morton em Era Uma Vez no Oeste (Once Upon a Time in the West, 1968). E, claro, não podemos nos esquecer do Espírito do Oeste, personagem que Rango encontra num sonho, que não é nada mais do que uma versão digital de Clint Eastwood no seu traje de Homem Sem Nome, ou o próprio Jake Cascavel, que guarda enormes semelhanças com Lee Van Cleef em Três Homens em Conflito (Il bono, il bruto, il cattivo, 1966).
Apesar de contar com um visual simplesmente sensacional, desenvolvido pelo master Roger Deakins, que ano passado também desenvolveu o soberbo visual de Como Treinar Seu Dragão (How to Train Your Dragon, 2010), que flerta principalmente com uma paleta de cores pastéis, bem amareladas, para enfatizar a falta de água escandalosa daquela cidade; e de ter uma trilha sonora soberba, composta com Hans Zimmer (me flagrei fazendo batidas ritmadas durante a sequência da “metáfora”), Rango apresenta buracos enormes de desenvolvimento. Qual a função da raposa que chama Feijão (Isla Fischer) de “vaca”? Ou mesmo, por que insistir em colocar um affair amoroso entre Feijão e Rango? Algumas falhas de execução que estragam o resultado final.
Mas, de todo modo, Rango prova-se um filme inteligentíssimo, extremamente esperto. Rango é, para nós, assim como a água é para poeira: uma bênção. Uma pepita de ouro nesses dias de pobreza.
Por Victor Bruno
Filmes como este me lembram por que gosto de Cinema. Nada pode ser comparado ao sentimento, a sensação de êxtase de ver um grande plano, de sentir a força da equipe carregando a câmera em cima do dolly, a elegância de um enquadramento. E estamos falando de um filme de Max Ophüls (A Ronda, Carta de uma Mulher Desconhecida), mais elegância impossível. Sinceramente, não consigo imaginar um diretor diferente para O Prazer, pois este filme esbanja elegância e requinte desde seus créditos iniciais.
Mas o interessante, a ideia do filme é bastante simples. Ophüls e seus roteirista Jacques Natanson reúnem três contos do escritor francês Guy de Maupassant. Ophüls os filma de forma independente, criando três segmentos distintos, podendo serem assistidos de forma solta, sem comprometer o entendimento do que está sendo mostrado. No primeiro segmento, Ophüls conta a história de um homem de idade avançada (Jean Galland), que frequenta um local chamado “O Palácio da Dança” utilizando uma máscara. A justificativa – agora que está velho e perdeu seu charme e juventude, deve utilizar este disfarce para galantear mulheres mais novas.
O segundo segmento, e mais longo, conta a história de um bordel que deve fechar por um dia – ou melhor, uma noite. Esta história tem duas linhas narrativas: na primeira nós conhecemos os efeitos desastrosos que o fechamento temporário do bordel causa na pequena vila onde fica localizada, na costa Norte da França. Na segunda – e melhor – linha narrativa do segmento, conhecemos como foi o passeio das mujeres.
O último segmento, é o de história mais simples, entretanto, com a maior carga dramática. Um pintor, Jean (Daniel Gelin), apaixona-se instantaneamente por uma modelo, Joséphine (Simone Simon). Eles vivem uma vida de sonhos, trocam juras de amor eterno e todos esses clichês. Mas logo o amor acaba e eles vivem juntos apenas para manter as aparências. A convivência torna-se insustentável, e Jean foge da vida conjugal. Mas Joséphine descobre que ainda o ama, e tudo pode terminar em consequências trágicas.
E estas três histórias são contadas com o mesmo primor técnico e narrativo por Ophüls. Quem conhece, sabe: Ophüls era um artesão, um iconoclasta. Até por que, imagem é maior que som, no Cinema. Veja você, por exemplo, como os dez primeiros minutos do primeiro segmento, que ocorre dentro do Palácio da Dança, são a melhor parte da primeira historieta. Por que? Por que é ali, naquele ambiente furioso e agitado, onde o diretor alemão, mais seu fiel fotógrafo Christian Mantras, pode exibir toda sua grife. A câmera correndo no dolly de forma agitada. Repare no giro de 360o que ela faz.
Agora, obviamente que o filme não sobrevive apenas desta imagem. Curiosamente, apesar de toda elegância que eu apontei, dentro do estilo de seu realizador, O Prazer é um filme sobre gente como a gente (perdoem o trocadilho infame que fiz com o filme de Robert Redford), existe pouca suntuosidade, fora o trabalho de câmera realizado por Mantras e Philippe Agostini (o primeiro é o fotógrafo dos dois primeiros segmentos, Agostini fotografou o último). Aliás, antes de fechar este tópico: é de Agostini que vem a sequência mais impressionante do filme, a tentativa de suicídio de uma das personagens do filme, quando este se atira de uma janela. A cena começa normal, observando o diálogo. Então ele sobe as escadas. No momento em que a personagem sobe as escadas, no mesmo take, a câmera assume o ponto de vista dele. Vemos apenas a mão do suicida abrindo a janela. Ainda no ponto de vista da personagem, vemos sua queda, partindo a claraboia de uma espécie de estufa. Este plano seria repetido alguns anos mais tarde, só que desta vez por Christian Mantras em Lola Montés (Lola Montés, 1955), primeiro e único filme a cores de Ophüls, com a linda Martine Carol no papel principal. E certamente este plano subjetivo suicida influenciou Kubrick na cena em que Alex se joga da casa do Sr. Alexander em Laranja Mecânica (A Clockwork Orange, 1972), afinal, Kubrick era fã confesso de Ophüls.
Eu estaria mentindo se dissesse que, assim como Lola Montés, Le plaisir é só imagem. Não. Ophüls utiliza sua grife visual para investigar a vida da gente miserável e destroçada que ele decide filmar. Antes disso, o filme tem um roteiro poderoso, e simpático às pessoas que o filme mostra. Tente não se emocionar com o fluxo de consciência de uma das meretrizes do segundo segmento. Um momento, que justifica e esclarece os acontecimentos que se seguem. É extremamente minimalista, um monólogo com a câmera nos trilhos, se aproximando da personagem. E não há nada mais saboroso do que o minimalismo. Alie este roteiro sensacional com uma montagem ágil de Léonide Azar e a um design de produção excelente de Jean d'Eaubonne. Veja como, mesmo com Ophüls evitando que nós, o público, entremos no bordel do segundo segmento (para ele, nós somos bisbilhoteiros entrando na vida secreta dos homens que andam naquele lugar), podemos ver tudo que acontece naquele local. O ambiente é perfeitamente desenhado por d'Eaubonne e belíssimamente decorado pelo diretor de arte Robert Christides.
Mas, devo confessar. Max Ophüls é mestre. Ele ressucitou, na voz de Jean Servais, Guy de Maupassant. E qualquer um que tenha esse poder merece meu respeito. Ainda mais tendo a maestria de Ophüls.
Por Victor Bruno
É provável. É provável que eu esteja certo. Bem, eu estive acompanhando – assim como a massacrante maioria de vocês, leitores, a saga “winning” de Charlie Sheen. Claro. Apesar de não gostar de ouvir/ler fofocas sobre a vidra privada dos famosos, a vida privada de Sheen tem muito pouco de privada. E é bem sórdida, e todos nós gostamos de escutar sobre a sordidez dos outros. Além do mais, eu acho que você concorda comigo, a vida privada do filho de Martin Sheen tem muito pouco de privado.
E de toda forma, é impossível escapar das notícias sobre Sheen. “Sheen isso, Sheen aquilo.” O ex-astro de Two and a Half Men faz questão de aparecer o máximo. E o que nós podemos fazer sobre isso? Nada. Nada além de assistir o circo pegar fogo. E amamos assistir circos pegarem fogo. Sheen sabe disso. É uma espécie de complexo narcisista. Sheen – e suas “deusas” –, na anti-privacidade do seu lar, deve praticamente – nestes últimos dias de ira – vivendo uma rotina onanista. Uma obsessão por aparecer na TV. Agora ele pede 100 milhões de dólares por sua demissão da mais popular série norte-americana. Mas ele fez isso, claro simplesmente para chamar atenção. Não importa se seus advogados disseram se é para “fazer o Sr. [Chuck] Lorre pagar por seus interesses egoístas”. Sheen é o último homem no mundo para criticar alguém por seus atos.
O pior é que as pessoas parecem estar colaborando para a saga “winning” continuar com fôlego total. Na madrugada da última sexta, a polícia invadiu a casa de Sheen na busca de armas de fogo, já que Sheen está proibido de possuir este tipo de objeto em virtude de uma ordem judicial pedida por sua ex-mulher, Brooke Mueller. Pareceu bobo. Pareceu que o que aconteceu na delegacia foi:
- Pessoal, esse Charlie Sheen... ele é meio doido.
- Sim. Pode crer.
- Puxa a ficha dele, Jerry.
- Aqui diz que ele tem uma ordem judicial que o proíbe de ter armas de fogo.
- Sério? Vamos bater na casa dele.
E o que encontraram? Um rifle de 1800. No Twitter, mais de 2 milhões de seguidores. Santo Deus, e Brooke Mueller apareceu dizendo que exige que Sheen faça um teste psicológico para poder ter o direito de ver seus filhos novamente.
Agora Sheen aparece fazendo piada de si mesmo num vídeo circulando na Internet. Aplicativos já foram desenvolvidos para bloquear textos com conteúdos sheenescos. Hitchcockiano, felliniano, sádico (de De Sade). Agora é sheenesco. Então tudo que for escrito sobre bebidas e prostitutas será sheenesco? Legal. Isso me faz repensar, talvez Sheen esteja vencendo (winning, não esqueça-se), seu nome virou sinônimo de cafajestice. Eu preferia que fosse algo como gibsoniesco, em referência a Mel Gibson. Mel acabou de ser condenado a três anos de condicional, por violência doméstica. Mas deveriam ter lhe prendido por preconceito e charlatanismo, nos tempos que fez a tragédia chamada A Paixão de Cristo (The Passion of Christ, 2004). Filme mais vergonhoso impossível.
Eu fico com Alec Baldwin. “Tire um cochilo e peça desculpa. Você não pode vencer. Sinto muito, mais não podem.” Sábias palavras, Baldwin.
Mas não. Sheen, de cabelos bagunçados e com orelhas abismais prefere vender ingressos para seu show onde promete falar a verdade. Mas o que é a verdade? A verdade é que Sheen...
Sheen gosta de ver o circo pegar fogo. Mas e se –
Por Victor Bruno
Sem nenhum medo de errar, Alexandria de Alejandro Amenábar pode ser, tranquilamente, chamado de “o Spartacus do cinema espanhol”. O filme é poderoso. Um legítimo representante de um gênero ainda ativo no cinema moderno: o “espada-e-sandália”. Filmes como este supracitado Spartacus (1962), de Stanley Kubrick, ou O Colosso de Rhodes (1961), de Sergio Leone, que apresentam homens de toga discutindo o futuro do império, e soldados de... hum... espada e sandália.
Mas as similaridades param por aí. Este filme, o mínimo que tem, são batalhas contra bárbaros, como nos espada-e-sandálias comuns. Na verdade, não se está discutindo o futuro do império de ninguém, neste filme. A trama gira em torno de uma mulher, Hypatia de Alexandria (Rachel Weisz). Hypátia foi uma das maires filósofas, astrônomas e matemáticas da Antiguidade. Na época em que o filme toma lugar, Alexandria ainda era o maior centro cultural do Mundo Antigo, ao lado de Roma, e abrigava a famosa e suntuosa Biblioteca de Alexandria. Como o próprio filme nos informa, a Biblioteca, além de ser local de conhecimento, abrigava também cultos religiosos “pagãos”.
Fora do local, dentro da cidade, três religiões eram predominantes: os “pagãos”, os recém-libertos cristãos e os judeus. Com Roma tendo adotado o Cristianismo como religião oficial, os “pagãos” egípcios sentem-se ameaçados. A religião fundada por Jesus apenas alguns séculos antes torna-se mais arrogante e ofensiva aos olhos dos pobres politeístas. Brigas ocorrem em praça pública (sendo que uma delas, quando Ammonius (Ashraf Barhom) joga um “pagão” no fogo de ágora, a praça da cidade, vai engatilhar o conflito que predomina na primeira parte do filme), a situação torna-se insuportável. No meio do fogo cruzado encontramos Hypatia, ensinando Astronomia e Matemática aos seus escravos. Hipátia é obcecada por círculos, que, apara ela, é a forma mais pura da Natureza. Ateísta, é mal vista tanto por pagãos como por cristãos. Para piorar tudo, Orestes (Oscar Isaac) e Davus (Max Minghella), apaixonam-se por ela. Orestes é um patrício, com grandes chances de subir na vida política, enquanto Davus é um escravo que encanta-se pela religião cristã.
É interessante observar os aspectos quais o diretor Amenábar realizou esta produção. Após completar Mas Adentro (Mar adentro, 2004), retirou-se para Malta afim de realizar estudos sobre a Via Láctea. Enquanto isso, passou a pesquisar sobre a vida de grandes nomes da Astronomia, como Johannes Kepler, Galilei, etc. Mas, conforme disse em entrevista, ele se encantou por Hypatia. Ainda segundo o diretor, Alexandria é um filme sobre Astronomia, “para nos lembrarmos do que diziam-nos na escola”. Mas é, de certa forma, interessante Amenábar dizer isso, por que muito do enfoque do filme, principalmente na sua primeira parte (o filme é dividido em dois, conforme abordarei à seguir), é dado à parte política da trama. Na verdade, sendo mais preciso, político-religiosa. Afinal, o conflito do filme é engatilhado, como disse anteriormente, por divergências religiosas que existem na cidade romana (no período em que o filme se passa, Alexandria está tomada pelos romanos). Ora, se Amenábar diz que o filme é sobre Astronomia, o mínimo que eu posso esperar do cineasta é que o conflito surja de uma divergência científica. E até existe isso, afinal de contas, a personagem de Rachel Weisz (que, na época do lançamento do filme, ainda era a Senhora Aronofsky) é completamente desperdiçada na trama pesquisando se a Terra gira ao redor do Sol, ou é o contrário que ocorre. Chega a ser ridículo, numa das cenas, quando a Biblioteca está sendo sitiada por cristãos, Weisz ficar perguntando aos seus discípulos, o que eles pensam sobre as teorias, e do nada surgir um senhor comentando sobre Aristarco de Samos. Como pode-se ver, Amenábar e seu velho parceiro de guerra Mateo Gil, os roteiristas do filme, misturam ciência, religião e política de forma equivocada.
Mas a situação só piora quando nós vemos que toda a ladainha científica que o filme pregou até a sua segunda parte só serve para justificar uma coisa: o envolvimento amoroso entre Orestes e Weisz – e, até certo ponto, o de Davus. Na verdade, a importância de Davus na trama chega a ser tão efêmero que, quando ele vira um “soldado de Cristo” (o nome correto é parabolani) era preferível que ele tivesse morrido. Tudo bem, de certo modo, Davus (numa interpretação contida e eficiente de Minghella) é um sujeito sofrido, dividido entre o amor e a religião. Soa profundo para você? Pois não deveria. É fraco. Talvez até pretensioso e arrogante por parte de Amenábar. Davus é um sujeito unidimensional disfarçado de multidimensional. Quem é multidimensional aqui é Hypatia, interpretada soberbamente por Rachel Weisz. Weisz sim, dá vida à personagem. Coisa que nem Minghella e nem Isaac conseguem fazer. E é realmente uma pena que a dupla de roteiristas Amenábar e Gil tenham jogado fora uma personagem de tamanho peso para a trama.
Por outro lado, a parte política do enredo é desenvolvida de forma eficiente e bem trabalhada. Amenábar e Gil nos transportam para um mundo cheio de preconceito religioso e fundamentalismo desacerbado. É ridículo, e o diretor-roteirista faz questão de nos mostrar isso, como os religiosos se comportam, e o pior: em público. Utilizam-se de piadas infantis, como por exemplo, pouco antes da revolta “pagã”, quando Ammonius joga uma fruta numa estátua de um deus e diz “Ele reclamou? Não! Parece que ele também perdeu a voz!”. O que fica ainda mais interessante quando levamos aos dias de hoje, quando Sergio von Heldes da vida chutam santas e o mundo católico se irrita. Mas, claro, Amenábar e Gil não estão criticando o cristianismo ou o catolicismo. Críticas ao comportamento intolerante “pagão” também são feitas. Afinal, qual o real propósito deles se rebelarem contra os cristãos? Nenhuma. E todas estas cenas são eficientemente filmadas por Amenábar.
Entretanto esta beleza compromete o caráter histórico da obra. Amenábar adota um estilo excessivamente elegante para o seu filme. A elegância que o diretor adota beira o absurdo. Veja o design de produção de Guy Hendrix Dyas. É tudo muito limpo, muito alvo. É pedir demais que o público realmente acredite que a Alexandria de 365 d.C. era limpa e alva da maneira que o filme mostra. De todo jeito, a fotografia de de Xavi Giménez engole este efeito. Tudo isso comprova que a direção de Amenábar, apesar de muito bonita, é masturbatória. Qual a real função de inserir imagens da Terra flutuando no espaço? Parece que Amenábar quer dizer “Não é lindo? Fui eu que fiz!”.
Apesar destes erros e acertos, Alexandria é um excelente filme. Mostra como o Homem não evoluiu no que diz respeito a machismo, religião. Alejandro Amenábar constriuiu um belo equívoco. Vê-lo derrapar é mais bonito do que ver os outros derraparem.
Por Victor Bruno
(3/5)
Sou suspeito para falar de “Ragtime”. Também sou suspeito para falar de Milos Forman. Mas quando digo que sou suspeito para falar de “Ragtime”, não estou referindo-me ao filme, mas sim ao livro escrito pelo prolífico americano E.L. Doctorow. Afinal de contas, “Ragtime” é o meu livro favorito, e guardo-o carinhosamente na minha prateleira.
Milos Forman havia acabado de sair de um clássico dos musicais, e – como dizem para mim – um filme de importância sociopolítica incomensurável: Hair (Hair, 1979). Foi quando Dino De Laurentiis, o famoso produtor italiano, convidou-o para dirigir a adaptação do best-seller de Doctorow. Na verdade, Forman estava substituindo Robert Altman, que havia dirigido o fraco Popeye, em 1980, apenas um ano antes do lançamento deste filme. Deus sabe o que Altman foi fazer para desistir de Na Época do Ragtime, por que este é o filme perfeito para ele: múltiplas histórias, crítica aos costumes retrógrados de uma sociedade (por assim dizer) moralista. Enfim, cada um sabe o que faz. Mas, sendo sincero, Forman não era a melhor opção para dirigir este filme. O diretor tcheco simplesmente não soube como dividir os 155 minutos de filme para as seis linhas narrativas principais do filme.
Em linhas gerais, o objetivo de Na Época de Ragtime é montar um painel que mostre como funcionavam os costumes e as mentes da América no início do século XX. Em New Rochelle vive uma típica família de classe média-alta norte-americana – gramado mais-que-verde no jardim, uma hortinha no quintal, cerca, uma empregada, etc. Papai (James Olson) é o homem que tem o sagrado dever de manter a família funcionando. Na casa ainda vivem Mamãe (Mary Steenburger), Irmão Mais Novo (Brad Dourif), sem contar com o filho e o vovô e a empregada, Brigit. Não demora muito para percebermos que as coisas não são assim tão agradáveis nesta residência de New Rochelle: o Irmão Mais Novo é obviamente lunático, Mamãe tem seus direito de pensar revogado por Papai (são incontáveis as vezes que ela diz “Eu acho que...” e Papai a corta com a frase “Eu acho que minha esposa quis dizer...”).
As coisas só pioram quando surge um bebê na horta do fundo do quintal. Não demora muito para Sarah (Debbie Allen), a mãe da criança. Ela é negra e rapidamente já é tachada de “criatura abominável”. Nas palavras do policial que a leva para a casa da família: “Não podemos compartilhar os mesmos pensamentos que essa gente [negros]. Não são cristãos como nós.” Não obstante, surge a figura mais importante da trama: Coalhouse Walker Jr. (Howard E. Rollins Jr.). Elegante, bem-educado, pianista especializado em ragtime (“Primeiro eu toco o que pedirem. Depois, ragtime”).
Ao mesmo tempo conhecemos a história de Evelyn Nesbit (Elizabeth McGovern, linda). Carismática, enigmática, interesseira. Ela está casada com “Henry K. Thaw, de Princeton!”. Mas Henry K. Thaw está muito aborrecido, pois Sanford White construiu uma estátua, com claros traços similares ao da garota. É um nu que está pendurado no alto do Madison Square Garden. Resultado: K. Thaw mata White com um tiro na cabeça e agora responde a processo. Pouco tempo depois Nesbit conhece Irmão Mais Novo e Tateh. Ela se apaixona pelo Irmão Mais Novo e aparentemente cria afeição por Tateh.
Por gostar tanto do livro (parafraseando Forman, Doctorow escreve como um anjo), acabo ficando com mais dificuldades do que imaginava. Entretanto, vou separar as duas coisas. Caso contrário, acabaria ficando tal qual uma fã de “Harry Potter”, aborrecida por que parte X do livro não foi para o filme. Não, o problema não é este. O problema é que o roteiro do filme não consegue criar uma trama uniforme para o longa. Apesar do roteirista Michael Weller (e do roteirista Bo Goldman, de Um Estranho no Ninho, que teve participação não creditada) cortar grande parte das narrativas paralelas (por exemplo, no livro, acompanhamos a depressão do mágico Harry Houdini após a morte da mãe, e a trajetória de Tateh depois de deixar Nova York e ir tentar vida nova na Filadélfia), jamais conseguimos nos sentir totalmente envolvidos por aquela trama, que parecia tão promissora. Como Irmão Mais Novo conseguiu se envolver amorosamente com Evelyn Nesbit? Ninguém sabe. O roteiro de Weller salta de um segmento para outro de forma tão louca que a narrativa torna-se incompreensível. A personagem de Tateh é totalmente esquecida pelo roteiro, assim como Nesbit. Weller prefere dar mais atenção à personagem de Coalhouse Walker Jr., que – não por acaso – transforma-se na figura mais interessante do filme. Entretanto, se no livro, Walker era uma vítima das circunstâncias, Weller transforma-o numa figura arrogante e prepotente, que age com requintes de loucura e insanidade. Não à toa, a melhor cena do filme, quando Walker conhece Brooker T. Washington, foi copiada letra por letra do livro.
Mas se o roteiro é falho, não podemos falar o mesmo da direção de Forman. O homem filma como um lorde. Com uma elegância impressionante. Um exemplo? Repare na tensão que o diretor estabelece na cena do assassinato de Stanford White. Numa série de cortes ágeis e secos (mostrando, assim, um dos maiores trunfos do filme: a montagem precisa de Anne V. Coates), Forman mostra o estado de nervos de Henry K. Thaw, a ignorância de White sobre o que está para lhe acontecer e – ironicamente – o objeto que criou toda aquela situação: o nu de Evelyn Nesbit.
Além da ótima direção de Forman, o designer de produção de John Greysmark e a excelente trilha sonora de Randy Newman (sim, o mesmo Randy Newman da Pixar) marcam presença no filme. Inclusive a música One More Hour, que toca durante os créditos finais do filme, composta por Newman, foi indicada ao Oscar do ano de 1981.
No fim das contas Na Época do Ragtime prova-se um filme médio, que caiu no limbo do esquecimento, dentro da carreira de seu diretor. Forman, diretor de poucos filmes, escorregou feio com esta obra. Fazer o que? Nada. De toda forma, Na Época do Ragtime, com suas boas atuações (destaque para Elizabeth McGovern, que apenas alguns anos mais tarde estrelaria a obra-prima de Sergio Leone, Era Uma Vez na América, interpretando um papel similar), serviu de preparação para Forman produzir seu filme mais poderoso: Amadeus.
Por Victor Bruno